Entrei, há tempos atrás, na Livraria da Travessa para encontrar uma amiga.
Fui direto para a a estante de poesia, onde meu vício de "abrir de livros ao acaso" é aplacado mais rapidamente. A poesia me pega de cara, salta e entra pelos olhos, não ofereço resistência, vou folheando.
Acontece que naquele dia me chamou atenção um livro de capa meio "noir". O nome da autora - uma enormidade de consoantes enfieleiradas -, uma polonesa, tcheca, imaginei.
Abri numa página em que o título do poema era: Escrevendo um currículo. Fiquei pregada ali. Fui à orelha e li que era polonesa. Mas aí minha amiga chegou e, distraída deixei o livro e fui embora na certeza de voltar.
Não voltei, esqueci dela, mas não da poesia. Li uma matéria no Prosa e Verso do Globo e ia recortar, e alguma coisa também me distraiu e a tesoura ficou na mesa.
Mas poesia incomoda, fica martelando, se esconde quem saci e aparece quando estamos desarmados, um pouco assim: no banho, no meio da rua, na insônia improdutiva, e sempre acompanhada de "vou no google", mas como lembrar da ordem das consoantes?
Ontem, determinada, voltei à livraria.
Na estante, nada.
"Como era mesmo o nome?" Perguntei ao rapaz do caixa que me mandou perguntar ao vendedor, ele também sabia, como eles sabem coisas!, mas não lembrava o nome: "é difícil de lembrar".
Voltei para procurar o vendedor e em cima de uma mesa, eis que vejo :
WISLAWA SZYMBORSKA [POEMAS]
Lá estava Wilslawa que agora se sei que se pronuncia algo como: VISSUÁVA CHEMBORSKA, fumando seu cigarro e quase piscando para mim.
Peguei rapidamente o livro e fui atrás do poema do Currículo, li este e, mais um, e mais outro.
Comprei o livro e fui para o café, rezando para nenhuma amiga aparecer. Embalada por um chá, estava calor, mas não dá para tomar Coca-cola e ler poesia, e um bolinho de banana, passei uma das mehores tardes da minha vida.
Um pouco de Wislawa segundo a Companhia das Letras, editora do livro.
Aos 88 anos, Wislawa Szymborska vive desde menina em Cracóvia, cidade situada às margens do Vístula, no sul da Polônia. O fato de ter permanecido a vida inteira no mesmo lugar diz muito sobre essa poeta conhecida por sua reserva e extrema timidez. Contudo, embora os fatos de sua vida tenham permanecido privados, quase secretos, seus poemas viajam pelo mundo. Não são tantos: sua obra inteira consiste em cerca de 250 poemas cuja função, como declarou a poeta no discurso de Oslo, é perguntar, buscar o sentido das coisas.
Com sua poesia indagadora, Szymborska foi chamada “poeta filosófica”, ou “poeta da consciência do ser”. No Brasil, teve poemas esparsos publicados em jornais e revistas ao longo dos anos, mas esta edição da Companhia das Letras, com seleção, introdução e tradução de Regina Przybycien, é a primeira oportunidade que tem o leitor brasileiro de lê-la em português. A coletânea de 44 poemas é uma belíssima apresentação à obra dessa importante poeta contemporânea.
Com sua poesia indagadora, Szymborska foi chamada “poeta filosófica”, ou “poeta da consciência do ser”. No Brasil, teve poemas esparsos publicados em jornais e revistas ao longo dos anos, mas esta edição da Companhia das Letras, com seleção, introdução e tradução de Regina Przybycien, é a primeira oportunidade que tem o leitor brasileiro de lê-la em português. A coletânea de 44 poemas é uma belíssima apresentação à obra dessa importante poeta contemporânea.
Peguei de volta a estrofe que ficou martelando e me fez pensar em rasgar o currículo que tenho e fazer um outro, poético, que com certeza vai falar muito mais de mim do que o atual.
O currículo tem que ser curto
mesmo que a vida seja longa.
Obrigatória a concisão e seleção dos fatos.
Trocam-se as paisagens pelos endereços
e a memória vacilante pelas datas imóveis.
mesmo que a vida seja longa.
Obrigatória a concisão e seleção dos fatos.
Trocam-se as paisagens pelos endereços
e a memória vacilante pelas datas imóveis.
E tem muito mais, qualquer dia coloco outra que estiver me perturbando.
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