sábado, 18 de junho de 2011

Tem alguém aï?











Nunca pensei que tivesse alguém tomando deste lugar, mas tenho ouvido com alguma freqüência que o lugar está abandonado.

Nem sempre dá para vir até aqui, mas parece que algumas pessoas gostam de dar uma passadinha e se ressentem quando não acham nada novo, acham que o dono não está dando a atenção adequada.










Existe um tempo em que é quase uma necessidade revirar as lembranças, outro tempo em que se gasta fabricando lembranças que um dia serão lembradas e há um tempo ainda em que se gasta procurando uma lembrança que não vivemos, mas que daríamos tudo para ter vivido.

Para estas últimas recorro a um dos poemas mais lindos de Borges, escolha pessoal e intransferível.





Elegia da Lembrança Impossível

O que não daria eu pela memória
De uma rua de terra com baixos taipais
E de um alto ginete enchendo a alba
(Com o poncho grande e coçado)
Num dos dias da planície,
Num dia sem data.
O que não daria eu pela memória
Da minha mãe a olhar a manhã
Na fazenda de Santa Irene,
Sem saber que o seu nome ia ser Borges,
O que não daria eu pela memória
De ter lutado em Cepeda
E de ter visto Estanislao del Campo
Saudando a primeira bala
Com a alegria da coragem.
O que não daria eu pela memória
Dos barcos de Hengisto,
Zarpando do areal da Dinamarca
Para devastar uma ilha
Que ainda não era a Inglaterra.
O que não daria eu pela memória
(Tive-a e já a perdi)
De uma tela de ouro de Turner,
Tão vasta como a música.
O que não daria eu pela memória
De ter sido um ouvinte daquele Sócrates
Que, na tarde da cicuta,
Examinou serenamente o problema
Da imortalidade,
Alternando os mitos e as razões
Enquanto a morte azul ia subindo
Dos seus pés já tão frios.
O que não daria eu pela memória
De que tu me dissesses que me amavas
E de não ter dormido até à aurora,
Dissoluto e feliz.

Tradução de Fernando Pinto do Amaral


Obrigada pela saudade que nem sabia que estavam sentindo.