quinta-feira, 31 de março de 2011

Este é um comentário que vem copiado aqui. É quase como se fosse a continuação do texto do Ninho Vazio. Um dos integrantes do ninho falou: E que ninho aconchegante, viu! Muito obrigado, mãe, por manter nosso ninho sempre limpinho e tinindo!!!! Mil beijos!Nando Para todo o resto existe Mastercard.

domingo, 27 de março de 2011

Ninho Vazio


Eu não vivo sem o Google, alguém vive?


Custa relativamente barato: um computador, uma conexão rápida e lá vamos nós, horas e horas de viagem.


Ontem o Google não me foi de grande ajuda.


Fui procurar “O que fazer com o Ninho Vazio”, apareceram 271.000 resultados, mas não havia uma resposta específica.


Não estando no Google, não tive outro jeito que o de me virar com o que tinha.


Tirei o ninho de dentro do armário para ver em que situação se encontrava. Não estava de todo mal. Já há algum tempo atrás tinha dado uma boa limpeza, costurado umas palinhas que se tinham rompido, refeito o assoalho para que ficasse firme caso precisasse colocar algo lá dentro. Limpei bem a poeira, tentei arejar na janela, mas o vento forte impediu.


Aliás, se há coisa frágil é Ninho Vazio. Todo o cuidado é pouco, qualquer movimento brusco, ele voa, cai se despedaça, se rompe.


Também não pode ser guardado em qualquer lugar, o fundo do armário é o pior de todos, cria mofo, desaparece atrás de outras coisas, na maior parte das vezes atrás de lindas caixas cheias de desculpas perfeitas. De mais fácil acesso, estão sempre ao alcance da mão para serem usadas.


E assim, empurrado cada vez mais para trás, quando queremos mexer nele precisamos de algumas mãos para tirá-lo do lugar, ou pelo menos para segurar a escada enquanto subimos com medo de cair.


Pois muito bem, Coelhinho da Páscoa não existe, faltam quatro semanas para Páscoa, já é primavera, e as temperaturas teimam em não subir, mas o domingo amanheceu por aqui com o ninho limpo, tinindo de bonito, cheio de ovos de Páscoa.




Ninho Cheio, Ninho Vazio, isto não está no Google.

segunda-feira, 21 de março de 2011

Luares

Admiro os colecionadores. Passar a vida atrás de algo demanda esforço, disciplina e às vezes muito dinheiro.

Lembro sempre do José Mindlin contando como formou sua biblioteca, sonho em conhecer, ou as casas de Neruda com suas coleções malucas, mas uma especialmente interessante – sereias, ou figuras femininas que iam na proa dos navios para afastar os monstros marítimos, ou de ir ao Museu Nissim – Camondo em Paris, onde Monsieur Camondo decorou sua casa com móveis e objetos decorativos franceses do século XVIII e levou mais ou menos 20 anos para juntar duas cômodas francesas, idênticas, decoradas com placas de porcelanas de Sèvres. Mr. Frick em New York colecionou arte, da boa, e acordava no meio da madrugada para admirá-las em silêncio. Graças a seu espírito de mecenas podemos sentar na mesma sala e mergulhar naquela beleza.

Algumas coleções não custam nada, são conchinhas do mar, tubinhos de areia, folhas secas, que à medida que cruzam o caminho estende-se a mão e pega-se.

Não sei se a lua cheia desta semana está influenciando os espíritos, mas lendo a resenha de um livro no jornal, imaginei que o autor colecionava luares.

Este foi meu jeito romântico de entender o assunto do livro.

O título: Nocturne: A Journey in Search of Moonlight.

O autor, James Attlee, num passeio à noite na costa da Inglaterra viu-se de repente tomado pela imagem da lua nascendo, em suas palavras: “the rim of the harvest moon emerging from the sea, a monstrous, swollen aparition.”.

Como acontece com todos aqueles que, tocados por um acontecimento extraordinário, neste caso a lua, ou melhor, o luar, tudo passou a ter outra dimensão na vida de Attlee.

Começou pela observação do luar a partir do seu quintal, da sua rua da sua cidade e assim foi começando sua coleção. Mas as luzes das grandes cidades lhe roubavam os melhores momentos, e como numa grande coincidência, lhe caiu nas mãos um telescópio; depois uma ida a uma instalação de arte, onde o artista mostrava o resultado da transformação de notas da Sonata Moonlight de Beethoven em código Morse, que eram enviadas para a lua e, ao tocarem a superfície lunar eram de novo reenviadas para a terra. Transformadas pela viagem se convertiam em notas novamente. Para Attlee este som é mais adequado aos ouvidos do século XXI. Eu e o crítico discordamos, mas isto não invalida a coleção.

Attlee vai levando os leitores por passeios intermináveis em busca de luares: no Japão, no Arizona, nas observações sobre o luar de Goethe em Nápoles e de Dickens no Vesúvio, nas telas de Whistler onde o pintor, na série "Noturnos", usava tantas tintas e tantas cores tão diluídas para chegar na “luz” desejada que a tela precisava ser pintada deitada no chão para não escorrer.

Fiquei com vontade de procurar a minha coleção de luares, sim devo ter uma.
Como é algo que não dá para pegar e guardar numa caixa, numa gaveta ou numa pasta, vou ao Sótão e lá acharei com certeza.

E lá estavam...

O luar que iluminava, mas não vencia a noite em que tive a notícia mais triste da minha vida.

Aquele luar que iluminando uma pedrinha mínima no chão me fez levantar a cabeça para procurar de onde vinha a luz e me fez ouvir:
a lua nasce por detrás daquela mata
até parece um sol de prata
prateando a escuridão.
Para fazer uma música desta precisa ter Paixão no nome.

Também apareceu aquele da noite fria de inverno, noite de Santo Antônio, onde um olhar “acendia a fogueira no meu coração”.

Aquele luar de uma serenata: “A lua é um tiro ao alvo e as estrelas, bala e bala”.

E foram muitos e tantos que a sala antes escura agora brilha calma e prateada. Beethoven bem baixinho me ajuda a sonhar.

P.S. Este post vai sem foto, para que cada um se sinta tomado pelo seu luar.

segunda-feira, 7 de março de 2011

Janelas do Mundo




Jardins e livros são das coisas que mais gosto na vida, com eles por perto tenho a sensação de estar sempre em casa.

Uma vez fiquei sem fôlego, totalmente tomada por uma lembrança de infância ao ver uma enorme magnólia em Washington. A minha lembrança não era da árvore, e sim do perfume da flor. Na mesma viagem encontrei uma caixa de cartões com fotos de magnólias, comprei três.

Uma outra vez, em Londres, vi pela primeira vez na vida o florescer das cerejeiras. Não tinha nenhuma lembrança desta árvore, mas devo ter tirado umas 50 fotos das árvores na tentativa de manter comigo aquela beleza toda.

Com os livros é o mesmo. Na biblioteca pública de Boston fui procurar no acervo, Jorge Amado, na Poets House em NY achei Canção do Exílio traduzido para inglês. E nestas vezes como em outras me aquietei, estava em casa.

E sempre lembro de Borges: "Eu semprei imaginei o Paraíso como uma espécie de biblioteca".

Eu adicionaria: no meio de um jardim.

Hoje pensando em jardins e livros lembrei de um um recorte de jornal – New York Times.

Fui no Sótão e lá estava dentro da pasta azul.





WINDOWS ON THE WORLD

Maria Kodama and Matteo Pericoli
Mr. Borges’s Garden

Matteo Pericoli’s drawing of the view from Jorge Luis Borges home in Buenos Aires.
A certain house in the Buenos Aires neighbourhood of Recoleta has a window that is doubly privileged. It overlooks a courtyard garden of the kind known here as a pulmón de manzana – literally, the lung of a block – which affords it a view of the sky and an expanse of plants, trees and vines that meander along the walls of neighbouring houses, marking the passage of the seasons with their colours. In addition, the window shelters the library of my late husband, Jorge Luis Borges. It is a real Library of Babel, full of old books, their endpapers scribbled with notes in his tiny hand.
As afternoon progresses and I look up from my work to gaze out of this window, I may be invaded by springtime, or if it's summer, by the perfume of jasmine or the scent of orange blossom, mingled with the aroma of leather and book paper, which brought Borges such pleasure.
The window has one more surprise. From it, I can see the garden of the house where he once lived and where he wrote one of his best-known short stories, "The Circular Ruins''. Here, I can move back and forth between two worlds. Sometimes, following Borges, I wonder which one is real: the world I see from the window, bathed in afternoon splendour or sunset's soft glow, with the house that once belonged to him in the distance, or the world of the Library of Babel, with its shelves full of books once touched by his hands?


Este texto foi publicado no New York Times em 02/02/2011.

Desde de 1 de agosto Matteo Pericoli publica, uma vez por mês, textos e desenhos de vistas de janelas de escritores espalhados pelo mundo com o título de “Janelas para o Mundo”. Os desenhos são acompanhados por descrições do “dono” da vista.



Matteo é um ilustrador italiano conhecido pelo seu livro “Manhattan Unfurled” com desenhos de todo o horizonte de prédios de Nova York.

Seu segundo projeto, o livro “The City Out My Window: 63 Views on New York", ele desenhou a vista da janela de alguns moradores famosos de NY.

Neste projeto do NYT já foram visitados: Orhan Pamuk em Istanbul, Daniel Kehlmann em Berlin, Andrea Levy em Londres, Ryu Murakami em Tóquio, Chimamanda Ngozi Adichie em Lagos, Maria Kodama e Jorge Luis Borges's em Buenos Aires e Rana Dasgupta em Delhi.

Segue abaixo numa tradução livre o texto. Que me desculpem os tradutores, é só uma tentativa de fazer o texto chegar a quem não fala inglês.

Uma certa casa no bairro da Recoleta em Buenos Aires possui uma janela que é duplamente privilegiada. Ela abre-se para um jardim conhecido aqui como pulmão de manzanas – literalmente um pulmão verde – que lhe permite ver o céu e uma grande quantidade de plantas, árvores, e vinhas que serpenteiam os muros das casa vizinhas e marcam com suas cores a passagem das estações. Além disto, a janela abriga a biblioteca de meu falecido marido Jorge Luis Borges.

É a verdadeira Biblioteca de Babel, cheia de livros antigos, seus últimos papéis com notas rabiscadas pela sua pequena mão.

À medida que a tarde cai, eu descanso os olhos do meu trabalho para apreciar esta janela, e posso ser invadida pela primavera, ou se é verão pelo cheiro do jasmim ou o perfume das laranjeiras, misturados ao aroma do couro e do papel dos livros que davam tanto prazer a Borges.

A janela tem uma surpresa a mais. Dela, posso ver o jardim da casa onde Borges viveu e escreveu um dos seus mais conhecidos contos: “Las Ruinas Circulares”. Aqui eu posso ir e vir entre dois mundos. Algumas vezes, segundo o próprio Borges, me pergunto qual dos dois é real: o mundo que vejo da janela, banhado pelo esplendor da tarde ou pelo brilho delicado do por – do – sol, com a casa que lhe pertenceu à distância, ou o mundo da Biblioteca de Babel, com suas prateleiras cheias de livro que um dia suas mãos tocaram?

Vale a pena ir ao site de Matteo e conhecer seu trabalho.

O que a sua janela mostra e o que ela abriga?




A minha janela atual se abre pra tantas possibilidades quanto o número de outras janelas que vejo, e abriga meu trabalho de toda a vida: família.























sábado, 5 de março de 2011

3900 amigos

Percebi que este Sótão e Porão tinha recebido 3900 visitantes.


Como chegaram aqui? Não sei.
Um lugar para guardar coisas para encontrar ou se livrar de outras é assim mesmo. Recebe visitas inesperadas, mas nem tantas assim.

Sinal de que encontram o que querem.


A porta aberta é convite, a flor aberta é convite, e amizade não é convite é privilégio.





Para agradecer a tantos visitantes procurei uma poesia para os que já conhecem e para aqueles que por acaso entrarem aqui sem saber muito bem do que se trata.


Muito obrigado, é muito bom termos uns aos outros.





Beijos das Traças e dos Cupins





Com vocês, Vinícius de Moraes





Soneto do amigo


Enfim, depois de tanto erro passado
Tantas retaliações, tanto perigo
Eis que ressurge noutro o velho amigo
Nunca perdido, sempre reencontrado.


É bom sentá-lo novamente ao lado
Com olhos que contêm o olhar antigo
Sempre comigo um pouco atribulado
E como sempre singular comigo.


Um bicho igual a mim, simples e humano
Sabendo se mover e comover
E a disfarçar com o meu próprio engano.


O amigo: um ser que a vida não explica
Que só se vai ao ver outro nascer
E o espelho de minha alma multiplica...

A traição da Bainha das Calças

Fevereiro foi embora e no meio de tanta coisa quase ia esquecendo de contar a história da Suzy, que já nos brindou com uma história deliciosa de um vestidinho xadrez.










O carnaval, em março, está começando, e é bom pensar em como vai acabar.

Carnaval é uma época que nos permitimos tudo, ou melhor, há anos atrás onde nada era permitido o carnaval nos dava uma folga para viver as fantasias (por favor, com trocadilho) que desejássemos.

Quer ser cigana? Quer ser bailarina, pirata, mau-caráter, se travestir de mulher, usar a saia mais curta? Fique à vontade, é carnaval, ninguém está olhando. Todo mundo está como você, preocupado em ser outra coisa, pelo menos por alguns dias.

Suzy começa sua história assim:

Às vezes não são nossos vestidos que nos causam uma alegria ou tristeza.

Aquele que não ficou bem ajustado nos deixa inquieta, e nos compromete deixando-nos insegura.











Mas a bainha de uma calça?

Pode uma bainha também trazer preocupação ou encrenca?




Imagina só o que achei numa folha de papel cheia de pó, caída atrás da prateleira lá do sótão.

- Suzy, posso escrever que tinha também uns confetinhos e umas serpentinas desbotados?

Confete e serpentina, um não vive sem o outro e o carnaval não vive sem eles.

Dois irmãos nascidos com diferença de 1 ano.

Apesar do confete vir de “confetti” ou confeitos de açúcar que as pessoas jogavam umas sobre as outras em Roma nos corsos pelas ruas da cidade, eles apareceram pela primeira vez feitos de papel em Paris em 1892.

A serpentina por sua vez foi inventada 1 ano depois por um funcionário dos telégrafos que utilizou tiras de papel já utilizado e que iriam para o lixo.

Mas a história da Suzy é muito mais interessante:



A TRAIÇÃO DA BAINHA DAS CALÇAS



As roupas da excursão de barco foram afundando na água ao mesmo tempo em que os confetes foram colorindo o tanque.






- Confetes? Como?


Não fora aquele passeio pela Lagoa dos Patos organizado para fugir do carnaval, buscar sossego e tranqüilidade?


E agora... Confetes?


Aqueles velejadores não queriam fugir do carnaval?


Dali há uns 40 dias o tempo começaria a mudar e os passeios de barco teriam que ser suspensos até a primavera, então aproveitar esta semana para um longo passeio seria perfeito. Sim, e o mais importante: ninguém gostava de carnaval.


Mas, um momento... Sim, eram confetes, bem coloridos, não havia dúvidas.



Os bolsos das calças, amigos fiéis, tinham sido devidamente examinados, pelo dono das mesmas, mas a bainha, mulher de língua comprida, tinha sido traiçoeira.




Carnaval, ou melhor o tempo depois do carnaval, sempre requer explicação, mesmo quando se foge dele.


- Bem... sim...não...
É que no caminho do restaurante havia um bloco de carnaval e nos atiraram confetes...
Sim foi só isso mesmo... deve ter sido neste instante.




Muitas explicações tiveram que ser dadas.



E como toda a explicação, por mais que fosse sincera, havia sempre uma vírgula que deixava espaço para uma dúvida a mais. Uma hesitação, ou incongruência no contar e mais um confete pulava da calça.


A noticia se espalhou aos quatro cantos do Yacht Clube da cidade que se orgulhava de ter um carnaval que durava 1 semana - igual, só na Bahia.


No ano seguinte, já avisados do acontecido, outros tantos velejadores foram procurar “sossego” na Lagoa dos Patos, no sul do Brasil.





Içaram suas velas, e com suas bússolas apontando para latitude 31º21'55" sul e longitude 51º58'42" oeste rumaram para São Lourenço do Sul.





Tantos barcos entrando pelo estreito canal causaram um alvoroço na cidadezinha. Alvoroço igual somente com Garibaldi e Anita, afinal era carnaval, e se os próprios aparecessem ninguém iria estranhar.





À beira da Lagoa, entre figueiras, plátanos e coqueiros, improvisaram um ancoradouro seguro para passarem aqueles dias.





Depois de bem instalados e com muita fome, era a hora de procurar um restaurante, mas não servia qualquer um. Tinha que ser aquele, que ficava no caminho dos blocos, do carnaval de rua, que já começava a esquentar.



Pois bem, o refúgio calmo ficou para os barcos, pois se descobriu que os velejadores "fugiam" de um carnaval para entrar em outro.


Os mais jovens, sem precisar dar muitas explicações, rapidamente acharam o baile, e como convidados especiais, sem fantasia e sem máscaras, se esbaldaram até a Estrela D’Alva aparecer.



Mas, eram velejadores e não foliões, então, ao retornar ao barco trataram de retirar os confetes dos cabelos, bolsos, e não deixar vestígios, mas as caras e as pernas traíam o cansaço.



Esta fuga do carnaval para encontrar outro carnaval fez surgir o Encontro da Vela em São Lourenço do Sul, evento que entrou para o calendário náutico e que se repete todos os anos.


Além dos confetes, serpentinas, e velas içadas, o vento, que sopra constantemente na Lagoa, traz o aroma das baforadas do cachimbo do comandante desavisado João Hugo que esqueceu confetes na bainha das calças.




Suzy, obrigada pela foto correta.

Nas letrinhas miúdas à esquerda da foto está escrito: Velejar é passar uma esponja nas preocupações. J. H. Altmayer.

O comandante sabia das coisas...